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"Os diletantes são-no geralmente de ideias ou de emoções - porque para compreender todas as ideias ou sentir todas as emoções basta exercer o pensamento ou exercer o sentimento, e todos nós, mortais, podemos, sem que nenhum obstáculo nos coarcte, mover-nos liberrimamente nos ilimitados campos do raciocínio ou da sensibilidade.” Eça de Queiroz

Balada dum dia triste

João A. Moreira, em 14.08.13

           

 De há dois anos para cá,

Sinto um enorme desgosto

Neste catorze de Agosto.

 

E este ano, para agravar

Esta agonia mortal,

Deu-me uma vontade imensa

De voltar a Portugal.

 

De que tudo fosse como dantes,

Copos de vinho no ar a tilintar,

Comemorando o teu nascimento

Ó meu amigo, ó meu irmão ímpar.

 

Queria voltar a ver o teu sorriso,

Poder apertar a tua mão

E voltar a passear contigo

Partilhando a nossa solidão

 

Queria saber-te aí,

nos sítios do costume,

Rodeado de livros,

Com esses olhos vivos

Como lume

 

Mas, quem sou eu para querer-te aqui comigo?

Para colocar à frente dos teus

Desejos meus,

Se os teus 40 anos,

Decidiste festejá-los junto a Deus?

 

 

Timbó, Santa Catarina, Brasil, 14 de Agosto de 2013

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Poema de desencanto e de combate

João A. Moreira, em 17.07.13

Poema de desencanto e de combate

 

às quatro mulheres que amo

e à memória de Luís Abel Ferreira

 

 

Não há esperança

e…, ainda bem.

Pôr o amor à distância
e dedicar-se à agricultura
biológica.
Multiplicar o verde das alfaces.
Nunca foi preciso regressar ao real.
O real impõe-se com tanta realeza,
paramentado, ungido, sacerdote
que sacode segredos do capote!
O real reina, rima, rami-
fica-se
num enormíssimo ramo de rosas
antes do suicídio.

Não há esperança
e…, ainda bem.

Pôr a dor à distância
e dedicar-se à agricultura
com pesticidas.
Multiplicar o verde dos venenos.
O que, por real, se entende,
tem sido mal entendido
por gerações de poetas
sem antenas
ou só metade semi-descritivos
que é chão que não dá uvas:
e a fermentação urge toda nua
das uvas bem pisadas por mil putas
prà grande bebedeira cristalina.

Não há esperança
e…, ainda bem.

Viver condor
(transferência de um estado doloroso
para o nome de uma ave de rapina).

Pôr o amor à distância?

Nanja eu. Voar custe o que custar.
Quero o amor mais perto de mim
do que a minha veia jugular;
e quero pôr a dor à distância
mesmo sem esperança.

O real não tem fronteiras.
Impossível separar o real do espírito.
Ou amputar-lhe a mão azul
que se apodera da transcendência.
E aqui é que bate o ponto da distância.

De Deus, já não há verosimilhança,
mas, sim, ausência ou indiferença,
ou a moda da incompreensão de Buda,
que semeou as papoilas do ópio

com os cílios das suas pestanas
e não alfaces.

Não há esperança
e…, ainda bem.

Só a distância é que nos salva?

É melhor tirar a égua da chuva.

O real não perdoa
e…, o amor também não. 

 António Barahona, in Telhados de Vidro nº.17, Averno

 

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Passou um ano sem passar um dia...

João A. Moreira, em 17.06.13

É Domingo. Chove por Timbó. Uma chuva suave e refrescante que me recorda a chuva beirã. Daquela que faz falta, como dizem os homens da lavoura, e que se entranha na terra dando vida nova às árvores e às flores. Terias gostado desta chuva, embora te fizesse falta o cheiro a terra molhada acabada de lavrar e o ligeiro arrefecimento do ar que impele ao primeiro agasalho do Outono.

É Domingo. Chove por Timbó. Passo a tarde a deambular contigo por ruas desertas de gente, com a chuva a refrescar-me a face, como tantas vezes fizemos pelas ruas de Coimbra e de Lisboa. O mesmo passo lento, pausado, marcado pelo ritmo da conversa e por longos silêncios partilhados.

Passou um ano sem passar um dia em que não estivesses por aqui, algures, a fazer-me companhia. Num livro de Agustina, num filme do Ford, num solo de Coltrane, numa carta reencontrada, numa oração recordada, num passeio solitário, numa tarde de bar, com livros espalhados sobre a mesa e pequeninos cartões de anotação preenchidos com uma letra miúda, redonda, inconfundível.

Passou um ano sem passar um dia em que não tivesse contigo longas e reconfortantes conversas noturnas. Por isso, sempre que sinto aproximar-se a egoística dor da saudade procuro-te, como sei que gostarias e, confesso, não me tem sido difícil encontrar-te, Luís Abel.

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